Na iminência de ser preso, o último refúgio é se esconder em uma embaixada na capital federal. O Brasil vive um período de tumulto político que contamina também as Forças Armadas. Há risco de o país vivenciar mais um golpe de estado, ou mergulhar em uma guerra civil. O alvo da repressão é o político acusado de tumultuar a vida do Brasil, com o envolvimento em constantes debates políticos e apoio do comandante da marinha de guerra. O Congresso Nacional vive dias de fortes disputas com deputados se posicionando ao lado do crítico contumaz do presidente em exercício e do grupo político que o apoia. Onde vai dar isso ninguém sabe. Os jornais da capital da república também estão divididos e publicam versões divergentes sobre os rumos do país e a responsabilidade sobre o tumulto que divide a nação. Para os que estão ao lado do governo, há um único suspeito, o ex-deputado populista que tem amplo espaço na mídia oposicionista e não se cansa de incitar militares a se afastarem do presidente da República e restaurar o que chama de volta à democracia.
A perseguição política contra ele se deve à influência que tem sobre os que fazem oposição ao presidente da República. A armação de um golpe de estado contra o governo é um tema recorrente nos corredores do Congresso Nacional e nas rodas políticas da capital. Como pode alguém que ajudou a escrever a Constituição querer burlar as “quatro linhas” da Carta Magna? O crítico voraz contra o presidente e a elite que governa o país ganha contornos de uma disputa pessoal. Afinal, os dois foram candidatos à presidência e a mídia diz que o perdedor não se conforma com a derrota e quer mais um turno das eleições. Todos sabem que paira sobre o processo eleitoral uma forte suspeita de fraude com os cabos eleitorais tocando manadas de eleitores para votar em não se sabe quem. Mas a elite sabe. Quer se consolidar no poder e uma figura como o opositor pode pôr tudo a perder. A saída mais fácil é persegui-lo nas ruas, no local de trabalho e até mesmo na porta de uma embaixada, pois mais de uma vez seus críticos dizem que ele espera uma oportunidade para pedir asilo a um país estrangeiro. Uma vergonha. Só mesmo em uma “república das bananas”.
Não lhe resta alternativa senão procurar abrigo em uma embaixada estrangeira na capital federal. O local é resguardado pelo direito internacional e nenhum país pode violar a integridade de uma embaixada, nem mesmo em época de guerra. Bem que os soldados tentaram arrancar o político de lá, mas recuaram diante da resistência do embaixador e avaliaram os danos que isso poderia provocar na diplomacia brasileira. Considerado o autor intelectual do levante armado, Rui Barbosa, redator-chefe do Jornal do Brasil, se internou na embaixada do Chile no Rio de Janeiro. O governo pode mantê-lo preso indefinidamente no prédio, mas em consideração ao seu passado político, tinha sido Ministro da Fazenda do governo provisório de Deodoro, consente que saia do país. A Revolta da Armada eclode em 1893, liderada pelo almirante Custódio de Melo que ameaça bombardear a capital. É sufocada pelo ditador Floriano Peixoto, chamado de “Marechal de Ferro”. Para uns é o consolidador da República dos Estados Unidos do Brasil; para outros, um genocida que não se apieda dos derrotados. Rui consegue fugir para Buenos Aires, de onde se muda para a Europa e se estabelece em Londres. Dizem os admiradores que para sobreviver dá aula de inglês para os britânicos. Mas não restam dúvidas de que as críticas que envia para o Jornal do Commércio, do Rio de Janeiro, são autênticas. Fazem parte da história política do Brasil com o título de Cartas da Inglaterra.
*Heródoto Barbeiro é jornalista da Nova Brasil (89.7), além de autor de vários livros de sucesso, tanto destinados ao ensino de História, como para as áreas de jornalismo, mídia training e budismo. Apresentou o Roda Viva da TV Cultura e o Jornal da CBN. Mestre em História pela USP e inscrito na OAB. Acompanhe-o por seu canal no YouTube “Por dentro da Máquina”.