Ninguém, até este momento, pode imaginar que é possível juntar opositores e adversários em torno de um ideal comum. A intenção é restaurar a democracia no Brasil. Políticos e partidos políticos chegam à conclusão de que é preciso esquecer as divergências do passado. Sem isso, fica difícil tirar do poder o militar que ocupa a Presidência da República. Ele tem apoio das Forças Armadas e boa parte dos conservadores e direitistas. Representa um programa que impede a ascensão de líderes que possam pôr em risco os fundamentos da nação, entre eles a propriedade privada. Há forte reação, principalmente dos proprietários de terras que tiveram suas fazendas invadidas por agricultores aos gritos da implantação de uma reforma agrária. Por sua vez a burguesia industrial teme a volta do fortalecimento dos sindicatos, paralizações da produção, greves por melhores salários e condições de trabalho. Há um forte sentimento anticomunista, o temor que esse regime possa ser implantado no Brasil, como ocorreu em alguns países da América Latina, e Cuba é o maior exemplo.
É preciso esquecer as divergências do passado
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Bater de frente contra o Poder Executivo já mostrou que não funciona. Nenhum líder político isolado tem condições de liderar o movimento popular, uma vez que há fortes divergências entre as correntes que o compõem. Ninguém, pelo menos até este momento, pode imaginar que seja possível juntar opositores e adversários em torno de um ideal comum, como a volta à democracia, ao Estado de Direito, liberdade de manifestações políticas, garantia de opinião e reunião. Para boa parte da população espalhada pelo Brasil, esses ideais não comovem, ao contrário dos habitantes das grandes cidades, principalmente no Rio de Janeiro e São Paulo. Os ecos de descontentamento chegam à capital da República, Brasília, onde os que detêm o poder vivem encastelados, e emanando ordens na direção do que entendem ser melhor para o país. Não há pressão direta sobre o Congresso Nacional, que tem na sua composição uma maioria conservadora e refratária ao que entende ser um processo de comunização do Brasil, graças às lideranças históricas da esquerda.
Os adversários chegam à conclusão de que é necessário deixar de lado suas divergências e se unir em torno de ideais comuns como democracia, liberdade e eleições livres e diretas para todos os cargos do governo, do presidente da República ao prefeito das capitais. Juntar os opositores em uma Frente Ampla é um trabalho árduo e precisa de uma liderança forte. O jornal Tribuna da Imprensa publica um manifesto contra o presidente e o regime militar. Anuncia a formação de uma coligação de líderes que almejam a volta dos militares ao quartel. O jornalista Carlos Lacerda, conservador, líder político dessa facção no Rio de Janeiro, obtém a adesão, primeiro do ex-presidente Juscelino Kubistchek, em seguida do vice-presidente e depois presidente João Goulart, também exilado. Nasce a Frente Ampla, e o primeiro passo é organizar manifestações de protesto. A maior ocorre no Rio de Janeiro, a passeata dos cem mil. O sistema militar reage com mais apertos. Decretos são divulgados, pessoas presas e a imprensa sob censura. O movimento liderado por Lacerda, JK e Jango não resiste aos atos institucionais. O de 1968, o AI-5, sob o governo de Costa e Silva, fecha de vez o regime e impõe uma ditadura de fato no Brasil. A Frente se dissolve, e, pouco tempo depois, morre JK em um acidente de carro na via Dutra, Jango tem um enfarte no Uruguai, e Lacerda tem o mesmo fim. Durou pouco o movimento, e os militares ficam no poder até 1985.