Itamaraty não toma partido. Diante de uma invasão com o mais poderoso exército do mundo, o mínimo que se espera é uma condenação do Brasil. Nada. O Barão do Rio Branco, patrono da diplomacia tupiniquim, deve estar dando voltas na tumba, dizem os comentaristas políticos na imprensa. O noticiário diz que cidades são arrasadas e a população civil é massacrada. Nem crianças e mulheres escapam. A fúria da vitória a qualquer custa se processa com a prisão de governantes das vilas e cidades, que são sumariamente fuzilados. Não querem colaborar, são “sabotadores” divulga a propaganda do exército invasor. A destruição de prédios, casas, palácios e até bibliotecas são estampadas nas capas dos jornais de todo o mundo. Inclusive no Brasil. Nem assim o governo se mexe. Está mais ocupado com os movimentos políticos locais, a distribuição do poder entre as oligarquias estaduais e se a chamada política do “café com leite”, São Paulo e Minas Gerais, vai se consolidar.
Não é problema do Brasil. É uma guerra distante e que envolve países que não têm tratados militares com o país. As embaixadas no exterior estão inertes. Ninguém sabe quais são os rumos do mundo depois que essa guerra terminar. Os inimigos se acusam mutuamente de cometer genocídio e não respeitar as leis da guerra de Genebra. Vale tudo para esmagar o inimigo, bombardeios aéreos e terrestres, granadas, lança-chamas, barragem de gás letal e outras contribuições da indústria de guerra. Há quem defenda que o que está por trás da guerra é a ocupação de todo o território inimigo, anexação de terras, mudança das fronteiras e imposição de sua língua e cultura. Não há organização internacional capaz de intervir na guerra. Os historiadores se dividem entre os que qualificam a guerra como um conflito dos imperialismos capitalistas e o nacionalismo radical herdado do passado. O fato é que o número de mortos aumenta rapidamente e os generais são acusados de usar os soldados como bucha de canhão. Onde faltam equipamentos enviam pessoas que não sabem por que matam os que estão do outro lado da linha.
O presidente é uma nulidade em política internacional. O Brasil não tem o menor peso no jogo geopolítico e nem gravita abertamente como satélite de nenhuma das potências. Nem mesmo dos Estados Unidos, onde a opinião pública pressiona o governo para se envolver em uma guerra a milhares de quilômetros de distância, do outro lado do oceano Atlântico. Contudo, o afundamento de um transatlântico por um submarino alemão deixa mais de mil mortos. Wilson, presidente dos Estados Unidos, em abril de 1917, declara guerra contra a Alemanha. A guerra chega à América. O presidente Wenceslau Brás sofre pressão para que o Brasil saia da modorra diplomática e assuma uma posição sobre a guerra deflagrada pelo império alemão do Kaiser Guilherme 2. Os submarinos alemães se esforçam para impedir que os países da Entente – Inglaterra, França e Rússia – recebam matérias-primas e produtos agrícolas para o seu esforço de guerra. O Brasil vive da exportação desses produtos uma vez que vive a era pré-industrial. Pelo menos dois navios brasileiros que tentam chegar a Europa são afundados pelos submarinos alemães. Seis meses depois da entrada dos Estados Unidos, o Brasil toma posição e declara guerra contra a Alemanha. Coincidência? Pressão diplomática?? Divulgação da guerra pelos jornais? Uma mistura de todos esses fatores. O Brasil põe a cabeça de fora no cenário internacional.
*Heródoto Barbeiro é jornalista da Nova Brasil (89.7), além de autor de vários livros de sucesso, tanto destinados ao ensino de História, como para as áreas de jornalismo, mídia training e budismo. Apresentou o Roda Viva da TV Cultura e o Jornal da CBN. Mestre em História pela USP e inscrito na OAB. Acompanhe-o por seu canal no YouTube “Por dentro da Máquina”.