Hoje, também falando sobre carreira, uma convidada desdobrando a versão feminina - optar pela carreira ou ficar em casa para cuidar dos filhos? Está bem interessante!
- Você não tem muito jeito pra isso, né?!
Dei um sorrisinho amarelo como resposta para minha vizinha, que saiu balançando a cabeça e rindo com um olhar oscilando entre divertimento e desprezo.
Nunca pensei que pudesse me sentir daquele jeito. Eu estava me esforçando tanto, com o esguicho em uma mão e com o rodo na outra. Chegara mais cedo do trabalho e estava aproveitando a oportunidade para lavar a garagem, pois ao chegar notara o resultado de um “redemoinho” - papéis de bala, guardanapos, penas de passarinho etc.
Sempre ouvira falar do preconceito existente por parte da mulher que trabalhava fora, para com a dona de casa (aquela que se especializara em cuidar da família e da casa). Eu mesma a via como alguém que fora injustiçada pela vida, que não tinha tido a oportunidade de cursar uma faculdade, arranjar um emprego e que tinha sido obrigada por um marido carrasco, a ficar em casa.
Faço aqui um parágrafo para elucubração. Vejo nessa situação, um paralelo com a mulher que tem filhos e a que não tem. A com filhos diz que tem inveja da que não tem, porque ela pode trabalhar fora, fazer seus próprios programas, sair e conversar muito mais com o marido, enfim ter mais liberdade do que a com filhos que fica muito mais presa em casa. Uma mulher pode não ter tido filhos biológicos, mas pode ser profícua, gerando filhos espirituais e obras boas e criativas! Por outro lado, a grande maioria das mulheres sem filhos morre de inveja das que são mães, e desejaria ter todos aqueles empecilhos por elas citados (até seus próprios filhos chegarem!). Que inquietação no coração do ser humano, que parece sempre querer aquilo que não tem, até ter para depois não querer mais!).
Naquele momento, porém, todo meu sentimento de compreensão pela “pobre dona de casa” caiu por terra e deu lugar a uma sensação de inferioridade. Para uma perfeccionista, aquela sensação foi terrível! Dei uma aprumada na mangueira e no rodo, não querendo assumir minha postura de não estar acostumada àquele tipo de coisa. Nisso, o esguicho escapou da minha mão e, com a força da água fez rodopios que acabaram me dando o maior banho! Deprimente! Toda molhada, com a autoimagem lá nos pés, fui para dentro buscando o conforto e a segurança do meu conhecido.
Hoje, dou até risada ao me lembrar daquela situação e percebo como ela foi reveladora, me mostrando o outro lado da moeda. A maioria das mulheres que eu conhecia que eram exclusivamente donas de casa, fazia questão de me passar a ideia de quão frustradas elas eram por não poderem alargar seus horizontes trabalhando fora. Eu era quase induzida a ter pena, ou mesmo a me sentir de certa forma superior a elas, mesmo sabendo teoricamente da dignidade inerente a todo trabalho honesto, dentro ou fora de casa. Foi, portanto, uma descoberta interessante captar aquele ar de superioridade, nada simulado.
Esse assunto continua polêmico. Creio que sempre haverá pessoas a favor e contra a mulher trabalhar fora. As justificativas, de ambas as partes, são várias, lógicas e convincentes. E nós, mulheres, como nos sentimos? A seguir vai uma lista para tentarmos ver os prós e os contra de ambas as situações.
TRABALHAR FORA
PRÓS
Ajuda o orçamento familiar
Possibilita relacionamentos e amizades
Oferece senso de realização profissional
Adquire-se o sentimento de ser útil
Aumenta o horizonte pessoal
Ajuda a compreender o mundo onde os maridos vivem e a luta que enfrentam
Contribui para a dignidade pessoal das mulheres com maridos sovinas, pois deixa de ser necessário “mendigar” para aquisições não essenciais, porém necessárias - pessoais, para os filhos ou para a casa.
CONTRA
Pode induzir a mulher a negligenciar a casa
Os filhos deixam de ter a orientação direta da mãe
Deixam de participar do cotidiano dos filhos, perdendo fases preciosas
Os maridos podem sentir ciúmes de seus relacionamentos
Ocorre maior desgaste e elas ficam com menos ânimo ao chegar a casa
Haverá sempre discriminação entre o salário feminino e o masculino. Pode então surgir o pensamento: “Vale a pena expor-se e não receber o valor merecido?”
E por aí vão os argumentos, alguns mais criativos e inteligentes, outros repetitivos e óbvios, mas os pontos de vista continuam a oscilar entre as duas posições.
Vemos na Bíblia exemplos como o da mulher virtuosa de Provérbios 31. Ela trabalhava fora - vendia propriedades, tecia roupas, dava ordens aos empregados etc. Seu marido era benquisto e considerado na cidade em que moravam. Talvez fosse até um político honesto, da época (!!!!!).
Por outro lado, vemos mulheres como a mãe e a avó de Timóteo sendo citadas e elogiadas pelo bom trabalho que haviam feito na educação do eficiente auxiliar de Paulo. Possivelmente, puderam estar com ele durante o período de formação, possibilitando a assimilação dos bons hábitos e informações por elas transmitidos a ele.
Enfim, creio ser essa mais uma das “áreas cinzas” da Bíblia, onde não encontramos nenhum imperativo referente à mulher trabalhar ou não fora de casa. As diversas situações, bem como a adequação do momento, podem levar uma mulher a buscar, ou não, seu trajeto profissional.
Creio que a maioria de nós conhece, ou pelo menos já ouviu falar, de situações em que uma mulher sofre sobremaneira, por não ter preparo algum para enfrentar uma vida profissional. Não há como prever uma viuvez, uma separação, uma vida como solteira. A Bíblia diz que devemos ser símplices como as pombas, mas astutos como a serpente. Buscar uma formação profissional, mesmo que não seja necessário utilizá-la no momento, faz parte de uma mente sagaz, que procura ser previdente e manter a dignidade da vida.
Fico feliz por saber que há donas de casa absolutamente realizadas e felizes por serem e fazerem exatamente o que fazem. Porém, também aprecio uma mulher profissional, gabaritada, capaz, que realiza seu trabalho eficientemente e se sente profissionalmente realizada. Ambas têm motivos de se orgulhar do que fazem sem, contudo, uma menosprezar a outra. Essa rivalidade, nem sempre velada, pode abalar relacionamentos e impedir amizades que poderiam ser oásis em meio a desertos.
Além disso, se a dona de casa tiver debaixo da manga, uma carta que possa tirar em momentos de necessidade, como um diploma; e, se a mulher profissional tiver possibilidade de também desenvolver o serviço doméstico para não precisar ser pega de surpresa com uma greve de ônibus que impeça a chegada de sua auxiliar, creio que ambas estarão sendo diligentes na vida e seguindo as dicas registradas na Bíblia para nos ajudar a viver.
Enfim, seja qual for a nossa realidade como mulher, dona de casa, profissional, ou ambas, o importante é que estejamos conscientes de nosso papel e que o realizemos o melhor possível. Podemos, sim, ser mulheres resolvidas, inteiras, dedicando nossa atenção e serviço à família e também a um trabalho externo. Por que não?
* Iara Vasconcellos é jornalista, produtora editorial e tradutora. Trabalha como editora assistente na Editora Hagnos em São Paulo. Matéria originalmente publicada na Revista Lar Cristão e utilizada com a devida autorização.