Sexta, 05 Janeiro 2018 20:06

Marília Gabriela fala sobre carreira e conta o que faz para envelhecer bem

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A Jornalista e apresentadora falou sobre longevidade e envelhecimento durante evento da Bayer em São Paulo

Ela dispensa apresentações e tem uma singularidade plural que faz qualquer conversa se tornar muito rica e desafiante. Marilia Gabriela foi repórter de rua do Jornal Nacional, cobriu de treino de futebol a presunto (jargão do jornalismo policial ) e esquadrão da morte. Aos 19 anos, saiu de Ribeirão Preto e veio para São Paulo trabalhar. Havia começado as faculdades de Psicologia e Artes Plásticas, estava perdida. Seu pai estava sózinho e viúvo lidando com as filhas – “minha mãe faleceu quando eu tinha 14 anos. Foi quando decidi vir pra São Paulo. Era o primeiro ano do Jornal Nacional e eu vi na TV um repórter numa rua, num país distante, falando pessoas num outro idioma. E eu falei: É isso que eu quero fazer na vida! Quero fazer perguntas em terras distantes, conhecer culturas diferentes, aprender idiomas e ser paga pra isso. E foi aí que fui pedir emprego na Globo”, relata.

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Conhecida principalmente por entrevistar grandes líderes políticos, como Fidel Castro, e personalidades culturais, entre elas, Madonna, ela conta que não fica nervosa ao entrevistar essas personalidades. “Não sou eu quem está em posição vulnerável, é o entrevistado. Sou eu quem faço as perguntas. Não tem por que ficar nervosa”. Ela também relata que o ato de perguntar às outras pessoas é uma forma de se conhecer melhor, pois entende que isso ajuda a se aceitar e encontrar respostas que ela mesma não costuma ter quando se questiona.

Gabi – como também é conhecida, vive na ponte aérea São Paulo – Rio de Janeiro, dividindo seu tempo entre vários projetos e viveu a revolução do início dos 1970 com os ideais de liberdade, feminismo e protagonismo no trabalho. Foi à luta cedo, casou-se 03 vezes. A jornalista é mãe de Christiano e Theodoro - e, avó de Valentina. É conhecida como uma mulher-polvo por abraçar diferentes oportunidades e conseguir fazer várias coisas ao mesmo tempo. Ela soma 48 anos de experiência com mais de 10 mil entrevistas em seu currículo. Começou sua carreira como repórter do Jornal Nacional e hoje é veterana da TV, atriz de teatro, cantora, escritora e empresária da área de gastronomia.

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Confira nosso  bate-papo que rolou durante Coletiva de Imprensa em evento da Bayer, em São Paulo, Capital para o  Universo de Rose. Marilia afirmou que ninguém fica feliz ao perceber os traços da velhice no próprio corpo,  contou a outros jornalistas que não têm prazer em se olhar no espelho, já chegou a gastar muito com cosméticos, suas aventuras na cozinha, na vida, na trajetória profissional. Confira nossa conversa – que rendeu, e, aproveite as dicas, que são muito práticas:

Universo de Rose – Quantas pessoas você já entrevistou até hoje, Gabi?

Marília Gabriela – Não tenho essa conta. Eu tinha um diretor que dizia que eu estava chegando aos dez mil, e isso faz um bom tempo. Acho que é mais do que isso. Eu faço perguntas desde 1969, então tirando os entrevistados famosos, eu entrevistei muitas pessoas que não estiveram na situação de uma hora de programa. Entrevistei desde Henry Kissinger a Shirley MacLaine, passando por Yasser Arafat, Fidel Castro, Dennis Hopper, Luciano Pavarotti,... vários presidentes brasileiros. Passei por aí...  

UR – Os anos passaram e você se manteve sempre em movimento, apesar de ter construído uma carreira brilhante. Como é envelhecer pra você?

MG – Eu tinha 35 anos quando me senti velha pela primeira vez, foi quando eu encontrei um fio de cabelo branco. Foi aquele desespero no primeiro momento. Eu não sou apaixonada pela minha imagem, nunca fui. Eu lido bem com o que me tornei, eu não vou me aborrecer, estou muito contente com tudo. Mas envelhecer é uma porcaria. Envelhecer fisicamente não é agradável e é isso o que estamos falando aqui - sobre como sobreviver adequadamente ao envelhecimento. O ideal seria escolhermos uma idade, sei lá, 36 ou 37 anos, congelar aquela cara e ficar com ela para sempre (risos).

UR – E como você sobrevive adequadamente ao envelhecimento?

MG – Comecei a me desapegar aos poucos da sensação e da impressão de importância e em que as pessoas sempre esperam algo de você. Eu cheguei a esse raciocínio e hoje tenho o privilégio de escolher parar. Então resolvi me dedicar mais a outras coisas em minha vida e também escolhi parar de depender da opinião alheia. Estou me dedicando ao teatro e tenho outros projetos, mas sem a necessidade da obrigação, e isso é maravilhoso. Eu gostei muito da minha carreira e do que fiz, mas não quero mais ter o compromisso que nos escraviza durante boa parte da nossa vida. Comecei a me desapegar aos poucos...

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UR – E quanto alimentação, exercícios físicos - você pratica algum?

MG – Eu faço Pilates avançado todos os dias, bebo muita água e tomo um café da manhã maravilhoso, com frutas e pães integrais, como de três em três horas – sou comilona e janto com parcimônia (risos). Quando não saio para jantar  - e saio pouco, tomo sopa e como saladinha. Então eu me alimento muito bem. Procuro envelhecer bem, para ter saúde; não ter dificultadores para ir e vir, poder se exercitar, comer bem, dormir e acordar bem, minimizar efeitos de excessos, tudo isso contribui para envelhecer bem, para mim. Acho que quando você se cuida física e psicologicamente, a velhice chega e você não a percebe, a não ser pontualmente.

UR – Você também se enveredou pelos caminhos da Gastronomia...

MG –  Sim, eu sou sócia de Isaac Azar no restaurante Paris 6. Quando eu vi essa habilidade empresarial e essa alegria com que ele lida com tudo, entrei de cabeça e também tenho cotas, junto com meus filhos, na unidade do restaurante em Miami. Sou fã absoluta de Isaac Azar. Ele é um geniozinho da atualidade, um grande empreendedor. Porque montou uma rede com a qual atrai assuntos e pessoas do esporte e das artes, que são o universo de seu grande interesse. E ele capitalizou isso de uma maneira interessante, oferecendo vantagens para os seus sócios, e com isso foi crescendo e atraindo mais e mais pessoas. Isso foi fundamental para entrar no ramo.

UR – A pergunta que não quer calar, Gabi: você sabe cozinhar?

MG – Sim! Houve uma época que durante um tempo, eu era a responsável pela ceias de natal da família. Organizava, depois que eu fazia tudo, sentava  e ficava assim, perguntando pra todo mundo: "Gostaram? Não gostaram? Estão gostando? Ficou bom?...". Era aquele espírito de natal que reinava... eu não sou uma grande cozinheira; eu sei fazer algumas coisas, até entendo, mas não é a minha vocação primeira (risos).

UR – Você comentou que não gosta de espelhos. E como cuida do visual?

MG – Sim, não gosto. Eu só me olho no espelho quando necessário, quando me arrumo. E meu banheiro é cheio de espelhos, feito por um arquiteto, mas eu realmente não sou apaixonada por me enxergar. E tem os cremes, os cosméticos, que eu realmente gosto bastante. Um ex-marido falava para mim: “você já gastou um carro em cremes”, ele brincava com isso. Não gosto de compras, mas eu uso bastante creme, cosméticos para revitalizar e cuidar da pele, gosto de experimentar as novidades, sim (risos).

 

UR – O que você sentiu nessa coisa de espelho?

MG – Quem é? Quem é essa mulher que eu não reconheço? Quem é ela? Aí voltei para o quarto, fotografei essa imagem, e fui olhar fotos minhas de variados momentos... só que eu não me lembro desses momentos. Eu vivi a vida inteira com tal velocidade, com tal intensidade, que eu não me lembro deles. Então pedi a uma jornalista para buscar essas memórias, fizemos uma seleção. Vou usar essas memórias pra tentar fazer um livro de ficção sobre uma mulher. Está tudo num pen drive que eu botei num cofre. Ainda não tive coragem para ouvir. Porque eu não quero a boa parte, quero o pior e o melhor. Então vai ter coisa lá que vai me deixar bastante (simula um sufoco com gestos)... e eu acho bom. E desse material quero escrever um livro sobre uma mulher que está buscando a sua identidade pulverizada. Uma pessoa que está desde os 20 anos fazendo televisão e que todo dia alguém diz alguma coisa de você, sempre com uma imagem idealizada, para melhor ou para pior. Eu tenho uma identidade pulverizada, e quero juntar isso numa mulher, que quero criar. Eu espero que dê certo.

 

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UR – Você reconhece que sua libido reduziu consideravelmente após entrar na terceira idade. Como lida com isso?

MG – Não me causou qualquer problema. Eu namorei muito, casei muito, tive uma vida sexual ativíssima sempre, mas de uns tempos para cá eu não gosto tanto [de sexo] quanto sair para conversar com os amigos, ir ao teatro, ao cinema, jantar... volto para casa e durmo satisfeita. Vida sexual muito ativa  não é tão mais importante quanto sair com amigos e dar boas risadas. Fico fascinada quando vejo mulheres de idade dizendo que têm um fogaréu, uma libido enlouquecida. A minha abaixou consideravelmente, apesar de eu repor hormônios, etc. e tal. Mas não vejo a alteração como uma coisa ruim, acredito que faz parte de um processo natural de envelhecimento e substituição de interesses. Eu espero que a minha velhice, aqui assumida, possa servir de utilidade para outras pessoas (risos).

UR – Atriz e entrevistadora. Essas atividades se misturam?

MG – Elas têm em comum uma coisa muito importante que é ouvir bem. Eu me vanglorio disso, acho que aprendi a ouvir muito bem. Ouço bem as pessoas porque tenho uma genuína curiosidade pelo outro e porque procuro respostas para mim também. Faço o que todo mundo deveria fazer todos os dias com todos: ouvir o próximo bem. E isso é fundamental no teatro. Então são duas profissões em que ouvir com propriedade é fundamental. Posso estar com problemas imensos, mas eu sentei na frente de alguém para entrevistar, eu estou ali inteira com todos os meus sentidos ligados no que irei ouvir desta pessoa - sempre, até hoje.

UR – Perguntar sobre o outro também é uma forma de se conhecer?

MG – Sempre. Bom, eu tento. Mesmo porque eu acho que nós estamos em todos os outros. Se eu ficar um pouco mais com você, eu vou me reconhecer em várias coisas suas, dela, dele,... Eu me identifico com os entrevistados em muita coisa. E fico procurando respostas pra mim, inclusive aquelas fundamentais que a gente nunca consegue ter.

UR – Você saiu da TV?

MG – Eu resolvi sair da TV porque cansei. Minhas obrigações, hoje, eu estabeleço com prazos de duração. Estar em evidência te condiciona a certas expectativas. Hoje em dia, faço o que quero e a minha resposta é absolutamente intima e satisfatória, eu escolhi parar de me preocupar com a opinião alheia.

 

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UR – Como você define o seu momento hoje?

MG – De uns dois anos para cá, eu pensei em dar uma parada. Eu trabalhei enlouquecidamente e comecei a achar que o tempo passa muito rápido, queria fazer outras coisas. Fui discutir com o analista, expliquei a situação no SBT e fiquei só no GNT. Mas eu sou uma freak mesmo! Não consigo parar. Logo eu estava fazendo a peça e pensando num novo livro. E ainda prometi para a editora Casa da Palavra uma parte nova do livro que lancei em 2008, “Eu que amo tanto”. Dessa vez será também com depoimentos de homens, já que o primeiro fala só de mulheres que perderam a compostura por amor.

UR – Você tem dificuldade de dizer, “não”, Gabi?

MG – Não. Não tenho mais. Eu já consigo dizer não. Tenho dificuldade de dizer não para as minhas vontades, entendeu? Agora por exemplo eu tenho uma vontade de trabalhar com música, ando fazendo aula de canto e quero voltar a cantar. Faço aula de filosofia porque acho que vai me ajudar a fazer o livro, enfim, eu não tenho forças pra dizer não para as minhas necessidades. Já o teatro me dá essa fantástica experiência de discutir a vida de uma forma tão lúdica. Porque ali é onde está a vida: as mazelas, as alegrias. É uma busca que parece que não vai dar em nada, mas eu vou ficar buscando até o último suspiro, entendeu? Por quê, para quê, quem somos, de onde viemos, pra onde vamos?

UR – Quem é Marília Gabriela?

MG – Eu faço essa pergunta tão cruel pra todo mundo e você vem fazer pra mim? É cruel mesmo (risos). Eu sou uma mulher do meu tempo, eu sou igual a inúmeras outras mulheres que foram à luta, criaram filhos e foram tomando o seu espaço. E delineando seus limites. Eu sou isso, não tenho grandes segredos. Uma mulher que teve que ficar muito senhora de si para sobreviver. Já chorei no escuro, mas na rua sempre fui o “vamos em frente”. Uma pessoa mais alegre do que triste, de achar mais bonito do que feio. O que não quer dizer que de vez em quando eu não me afunde na lama, mas isso dura pouco. Está vendo, eu sou uma pessoa caótica. Essa é a minha tradução (risos).

Imagens: Divulgação / Carlos Cianci

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Rosângela Cianci

Jornalista, repórter, palestrante, apresentadora, produtora de TV, idealizadora do site Universo de Rose. Incansável observadora do cotidiano, sou apaixonada pelo que faço. Ex-Secretária Executiva, sempre lidei com Diretoria e Presidência, mas, prestes a completar Bodas de Prata na área, resolvi desengavetar um sonho antigo: o Jornalismo. E parti pra nova luta com 40 (e uns anos), pois meu negócio é escrever e conversar sobre assuntos de A a Z...

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